Há 30 anos atrás: Brizola governador

O ano de 1982 foi marcado pela eleição de Leonel Brizola ao governo do estado do Rio de Janeiro pelo PDT, nos últimos anos da agonizante ditadura civil-militar de 1964.
A eleição foi marcada pelo meteórico crescimento de Brizola nas pesquisas, onde seu nome aparecia com 2% das intenções de voto no início da campanha. Além disso, o pleito também foi marcado pelo escândalo Proconsult, esquema de desvios de votos com o intuito de favorecer o candidato do partido da ditadura, Moreira Franco (PDS), em detrimento de Leonel Brizola (PDT) e Miro Teixeira (PMDB).
Aliado ao confuso sistema de apuração dos votos estava a divulgação dos dados por parte da Rede Globo (TV e jornal), que de certa forma colaborava com a fraude, ao emitir boletins atrasados da capital e Baixada, onde Brizola ganhava mais votos, dando a entender que Moreira Franco liderava a disputa. No fim das contas, Brizola foi eleito governador com 34%. Moreira Franco obteve 30% dos votos, Miro Teixeira 21%, Sandra Cavalcanti (PTB) 10% e Lysâneas Maciel (PT) com 3%.
Reproduzo aqui matéria da revista Veja, de 24 de outubro de 1982, falando sobre os problemas na apuração e divulgação dos resultados:


Na cobertura da Globo, muita confusão e pouca notícia 

Na noite de 15 de novembro, Roberto Irineu Marinho, vice-presidente das Organizações Globo, queria saber informações sobre as eleições - e preferiu sintonizar o televisor no noticiário da emissora, a Rede Bandeirantes. Naquele momento, a Rede Globo levava ao ar, depois do Jornal Nacional, as aventuras de James Bond em o "Satânico Dr. No". Enquanto isso, a Bandeirantes, com um esquema muito mais modesto, apresentava uma entrevista com o senador Franco Montoro, favoritíssimo candidato ao governo de São Paulo. 

(...) E foi no Rio de Janeiro que o descontentamento ganhou mais força. No Alto da Boa Vista, uma kombi da Globo foi apedrejada por um grupo de brizolistas excitados. E apenas num dia, os funcionários receberam 3.800 telefonemas de pessoas queixando-se da transmissão - normalmente, este número não passa dos 200, e sempre há muitas vagas para elogios. 

A cobertura eleitoral da Globo, no Rio de Janeiro, foi uma decepção jornalística de vastas proporções - pois era justamente ali, com um páreo duro e apurações lentas, que mais importância tinha um bom trabalho de informação. Qualquer ouvinte que sintonizasse, por exemplo, a Rádio Jornal do Brasil na quinta-feira às 6 da tarde, saberia que Brizola já vencia Moreira Franco por quase 50.000 votos. Mas em seu "Show das Eleições", a Globo anunciava que o candidato do PDS vencia por 467.486 a 401.001. É difícil encontrar motivos para a divergência entre os números, que durou vários dias. 

A questão foi tratada com dureza por Brizola na noite de quinta-feira, quando compareceu ao "Show das Eleições" para uma eletrizante entrevista - programada para durar 15 minutos, levou 32, sem intervalos. Perguntaram a Brizola se ele já se considerava eleito. "Só a fraude pode impedir minha posse", respondeu. O repórter Paulo César de Araújo insistiu, alegando que Moreira Franco, do PDS, também sentia o mesmo temor. "Só se ele se baseia no noticiário da Globo", retrucou Brizola, dando início a uma discussão na qual a Globo se viu surpreendida e sem controle. 

"Os resultados do interior longínquo (onde era derrotado por Moreira) chegam logo", ironizou Brizola. "Mas para saber o que deu numa urna em Bangu está sendo uma dificuldade...". A certa altura, Armando Nogueira declarou-se ofendido com as insinuações e iniciou uma discussão com Brizola - o que apenas ajudou o candidato do PDT, com muito mais traquejo neste tipo de duelo, a lançar novas e afiadas farpas contra a Globo. "Nosso trabalho se baseia em computadores, na soma de todos os votos", explica Nogueira, "por isso somos mais lentos". 

Veja, 24 de novembro de 1982 
(No show das eleições, um pesadelo)

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